Gostaríamos de compartilhar um pouco da brilhante palestrado filósofo e educador Mário Sérgio Cortella em um seminário sobre família, escola e cidadania, que aconteceu em Florianópolis. Com senso de humor que lhe é característico, ele discorre uma palestra baseada nas ideias centrais de seu livro “Não Nascemos Prontos”.
Fazendo uma análise crítica e alertando os pais e os professores sobre a educação de nossas crianças e adolescentes, em dado momento ele os denominou de “geração miojo” por quererem tudo óbvio, pronto e rápido. Não querem saber de rituais, de dialética, de processos.
O grande desafio humano é resistir à sedução do repouso, pois nascemos para caminhar e nunca para nos satisfazer com as coisas como estão.
Nascer sabendo é uma limitação porque obriga a apenas repetir e nunca a criar, inovar, refazer, modificar. Diante dessa realidade, é absurdo acreditar na ideia de que uma pessoa, quanto mais vive, mais velha fica. Para que alguém quanto mais vivesse, mais velho ficasse, teria de ter nascido pronto e ir se gastando, e isso não ocorre com gente, pois pessoas não nascem prontas e vão se gastando, pessoas vão se fazendo ao longo do tempo.
Colocarei para vocês as citações mais interessantes desta palestra:
As crianças e adolescentes de hoje acham que desejos são direitos. Não entendem que as coisas para acontecerem têm um processo, demoram um tempo, dão trabalho. Segundo Contardo Calligaris, as crianças e principalmente os adolescentes de hoje parecem adultos em férias, ou seja, fazem de tudo, só não trabalham. E como não nasceram prontos, eles não têm ideia do trabalho.
É uma geração que acha que tudo é normal, que você gastar dinheiro que não precisaria para se ter uma marca é normal, e, como Frei Beto dizia, que quando era criança, “o que valorizava o tênis que eu usava era que EU usava... EU dava valor ao calçado e não ele a mim”. Se eu usasse ele ficava importante, agora é o contrário, como não nasceram prontos, tudo é óbvio, tudo é fácil. Estamos na ética do óbvio. “O mundo que nós vamos deixar para os nossos filhos depende muito do tipo de filho que nós vamos deixar para esse mundo...”
E que filhos nós vamos deixar?
Estamos na geração “miojo”, amor “miojo”, namoro “miojo”, estudo “miojo”. Tudo é prático e rápido. Esqueceu-se da importância da convivência, do estar junto, não se gasta mais tempo com as coisas. E nós nos acostumamos com isso. Acatar o prático nem sempre é o certo. Precisam saber que as coisas possuem um processo para existir, um processo de elaboração.
A nossa paciência se perdeu. Perdeu-se na tecnologia, por exemplo. O controle remoto alterou nossa percepção. Para que serve TV a cabo? Para não assistirmos nenhum canal inteiro. Hoje a facilidade deseduca nossa paciência.
Não é que a tecnologia deva ser descartada, o que ela não pode é nos submeter a ela. Outro exemplo, antes o telefone fixo fazia a mediação entre meus amigos e eu, hoje você não sabe onde seu filho está, porque ele é móvel como o celular. Não dá para controlar.
A tecnologia não é neutra, ela produz efeitos. Isso significa que devemos criar com os filhos outra lógica de comunicação, pois a personalidade ética é construída quando nós prestamos atenção, quando olhamos para eles com olhar deles como sendo outros. Os valores que eles terão são os valores que nós passarmos para eles.
Tudo é “fast”, tudo é imediato. Essa sociedade do imediato nos atinge, quando perdemos a paciência, quando procuramos o prático ao invés do certo, quando desistimos, quando esquecemos que eles não nasceram prontos e nem nós, mas podemos nos fazer e refazer de vários modos.
O tempo todo, ficamos no consumo de bens materiais, vivemos e partilhamos o Deus do mercado. Perdeu-se a noção de história, familiar e pessoal, resgatando o conceito de “Carpe Diem” que significa aproveite o momento, o dia. A lógica de que o mundo não tem história, e quem não tem história vive o presente até o esgotamento.
Viver o presente até o esgotamento significa querer aproveitar tudo de tudo, o que explicaria o alto nível de ansiedade, o alto estresse entre as crianças e adolescentes, o uso de substâncias psicoativas (álcool, drogas e remédios) para dar “uma turbinada” na motivação e na vontade; e a toda a ordem de “loucuras que a moçada anda fazendo” uns com os outros, na falta de respeito no trânsito, com os professores, os idosos, os mendigos...
Construir uma personalidade ética exige de nós, construir uma família ética, uma escola ética. Isto é, sermos capazes de conhecer, aprender e de nos prepararmos porque o nosso trabalho só terá sucesso pela capacidade de amorosidade, e amorosidade sem competência é mera boa intenção.
Ele finaliza a palestra com a citação do renascentista francês François Rabelais: “Conheço muitos que não puderam quando deviam porque não quiseram quando podiam”. A gente quer, deve e pode, pois alguém tem quefazer alguma coisa, portanto, aqui estamos.
Texto adaptado do vídeo: CLIQUE AQUI
Evelyn Rocha
Diretora pedagógica